Poesia hoje não se lê, se espalha. Os poemas (ou trechos deles) estão na internet, nas agendas, nos diários, nas letras de músicas. Não se deixou de ler ou de escrever poesia. Apenas se fugiu de uma visão clássica e aristocrática da poesia como dádiva dos deuses a determinados autores que escrevem para um específico público muito culto. Pablo Neruda, conhecido poeta chileno, aproxima seu fazer poético das mais simples atividades cotidianas no livro Para nacer he nacido: "Eu fui um apaixonado por estas criações anônimas e me catalogo, às vezes, enquanto à minha poética, como oleiro, padeiro ou carpinteiro. Som mão não existe o homem, não há estilo. Pretendia sempre que minha poesia fosse artesanal, antilivresca, porque até os sonhos nascem nas mãos" (tradução minha). Se a poesia é algo assim tão simples, tijolo saindo da mão do oleiro, pão amassado pelas mãos de um padeiro, cadeira-mesa-cama que a mão do carpinteiro elabora, por que deverá pertencer a uns poucos? Se é tão vital quanto o tijolo, o pão, a cadeira, é possível viver sem ela?
É então que ela se espalha. Os pães todos comerão, o tijolo construirá todas as casas, todos se sentarão em cadeiras. Poesia é para espalhar, como sementes. Trocar no facebook, escrever trechos e dar para os amigos, comprar em edições baratas, reler até os versos ficarem parte da gente, correrem pelas veias.
O poeta Manoel de Barros, tão padeiro quanto Neruda, disse que "poesia é para incorporar. Porque é nos sentidos que a poesia tem fonte". E disse ainda que "poeta não é necessariamente um intelectual; mas é necessariamente um sensual. Pois não é ele quem diz eu-te-amo para todas as coisas?".
E todos podem e devem sentir e incorporar a poesia: os que ouvem os versos do cantador nordestino, aqueles que reparam na letra da música, os que recebem por e-mail e ficam paralisados um tempo, aqueles que lêem Camões, Pessoa, Keats, Allen Ginsberg, ao lado de estantes repletas de livros. A poesia é pão quente para ser levado a todos.
Francisco Carvalho
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